segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Um domingo e algum escrúpulo

É domingo. Seis horas da tarde. Artur, inquieto, morde a própria carne dentro boca e procura algo que o deixe excitado. Ele é um cara branco que está sentado em frente a um monitor que mostra a seção de seleção de gêneros de vídeos pornográficos. Seus olhos acompanham o movimento da seta do mouse, começa a ler: "anal", "animais", "anões", "albinas", "asiáticas", ele ri. Antes de continuar lendo, desliza os olhos rapidamente para o lado esquerdo da tela, lá têm seios fartos com mamilos rosados que sacodem. Sobre os shorts que veste, ele coça seu saco e sente o pau mole. "Acho que foi por volta dos quinze a dezoito anos, que comecei a conhecer e a explorar  conscientemente a mim mesmo. Meus sentimentos, minhas vontades e medos. Tudo fede a merda. Sinto que sou uma continuação daquela mente até este momento. Talvez todo o tempo antes desse nascimento intelectual fosse como uma mera existência animal", pensou. "Menáge", ele leu, sorriu novamente.
Continuou a pensar, "São os pais, ou os que assumem a responsabilidade deles, que têm, como regra, a função de não foder a mente animal, assim como um embrião de pensamento, sob controle, ou seja, protegido de um dia desejar foder árvores ou a própria mãe". Acaba de ler "gangbang", ficou curioso com que merda pode ser essa e ao pressionar com o dedo indicador o botão esquerdo do mouse, que depois de dois segundos, fez com que surgissem na tela pequenos quadros enfileirados que mostram a prévia dos vídeos. Clicou em um deles que tinha a imagem de uma negra com a face quase branca, encharcada de gozo. Era o vídeo de cinco caras trepando com a mesma mulher ao mesmo tempo.
Depois de assistir dezessete minutos e quarenta e três segundos; que podem se resumir como o vídeo uma bela mulher negra de seios pequenos e firmes e quadris largos, ser quase violentada, revezadamente, por cinco indivíduos que pareciam neonazistas; percebeu que aquela mulher era muito parecida com Luana. - Que merda de gente doentia - praguejou sentindo quase náuseas por ver aquilo. Pensar em Luana sempre o excitou, - pobre Luana, porque fazem isso com ela? - Artur não sabe se é realmente é Luana, mas poderia ser. Não tem contato com ela desde a faculdade e, afinal, ela tinha fama de mulher que trepava com qualquer um, era uma mulher de necessidades simples. Não conseguiu continuar a olhar para a imagem de Luana sendo engasgada pelo pau daquele nazista impiedoso. Artur sentiu-se agredido, ou talvez, o que sentiu foi pena de Luana. Esticou o braço que antes segurava o mouse, apertou um botão e desligou o monitor. As pessoas têm gostos próprios. São tão próprios, que não conseguem compartilhar do mesmo interesse. Voltou a pensar, "bom, sempre acabo perguntando que teria sido mais feliz se as coisas fossem diferentes, se tivéssemos feito aula de piano ou inglês, talvez algum esporte ou, simplesmente se meu pai não tivesse molestado minha parte íntima tantas vezes. Sempre achamos que algo faltou ou excedeu naquela educação primária".
Artur levantou-se da cadeira e caminhou cambaleante, tonto, talvez, por passar tempo demais prostrado em sua cadeira. Foi até à geladeira e pegou uma garrafa de água. É amarela, não se sabe se a água ou a garrafa plástica, talvez ambas. Bebeu direto da garrafa. Enquanto sente a água descendo fria por sua garganta, pensa, "algo cheira a bosta na minha vida, talvez essa água seja tão suja quanto meu mijo. Que bosta de ideia. Quero pensar em relaxa e trepar com alguém ou algo. Sinto culpa, nojo ou tristeza demais para conseguir sentir vontade de meter meu pau noutras pessoas. No fim das contas, sempre somos condicionados a uma situação que tem que ser mudada par ser feliz". Parou de tomar seu mijo e repôs a garrafa na geladeira, que estava vazia, quando ouviu o barulho de uma vibração descontínua e abafada, na direção do sofá. Após Artur fazer algumas caretas, sua mão encontrou o smartphone, teve que enfiar a mão entre as almofadas, justamente onde sua mão tinha dificuldade de alcançar. Haviam duas ligações perdidas de um número de telefone desconhecido.
Ficou parado em frente à janela com o telefone à mão. O telefone toca, Artur atende-o:
- Alô.
- Artur?! fale cara, aqui é o Leandro, lembra? Estudávamos juntos na faculdade.
- Ah sim, - lembrava vagamente do sujeito, Artur tem uma memória, razoável para pessoas. Conseguiu lembrar, ainda, que Leandro, tinha um jeito de fresco, porque rebolava demais para caminhar. Sentiu nostalgia daquele tempo - como vão as coisas? tem mantido o contato com alguém de lá?
- As coisas estão bem, fui aprovado em um concurso público. Há dois meses, estou esperando a nomeação para o cargo de professor na Secretaria de Educação do Estado,  você sabe, burocracia, papeladas, exames médicos, requerimento de um lado para o outro.
- Uhum. - consentiu um pouco entediado pelo rumo que a conversa estava tomando.
- Bom, você sabe, né? Depois que nos formamos, a Luana e eu passamos a viver juntos, no meu apartamento, como um casal... - Artur sentiu seu sangue ferver à altura da virilha. Seu luto pela memória recente de Luana está curado. Convenceu-se de que aquela do vídeo não era ela. "Luana estava bem, meu desejo e aquela bunda grande e cheia de carne, estão bem", pensou entusiasmado. Leandro continuou - e agora que fui aprovado, estou procurando os amigos para nos reunirmos e festejarmos o nosso noivado que tá chegando.
- Não é precipitado demais um noivado? - perguntou, Artur, desinteressado e segurando o seu pau ereto na mão.
- Não o é. Não é exatamente como estávamos planejando, mas agora Luana está grávida e eu vou ser pai, temos que antecipar alguns passos...
Ao ouvir isso, Artur, imediatamente broxou. Estava se sentindo pior que antes. A imagem de Luana grávida, aos sete ou oito meses de gestação, surgiam em sua mente e lhe causavam mais frustração. Ele encurtou o máximo que pôde a conversa. Prometeu ir à festa e desligou o telefone. Aquela não seria uma noite fácil para Artur, seus pensamentos ainda cheiram à bosta. "Pobre Luana", ainda pensou.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Poema do Vício

Quieto não doía
o vazio que eu tinha.
Mal me acostumara,
mal percebia.
Afina, o que eu era?
Quase uma mentira. 

O vazio
que eu tinha, 
ninguém mais sentia,
nem mesmo eu sei, 
ao certo, o que eu queria.

Quando te vi,
notei o quanto te queria.
O vazio que me possui
agora fere e consome,
notei que perderia, talvez,
uma vida.

Quando sentia a tua paz,
meu vazio, 
aos poucos, 
se desfazia,
Não importa o que eu tente:
é que meu vício agora,
é a tua alegria.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Nem mais cinco minutos.*

É garota, só quero que te vires pra que eu possa olhar com meu olhar mais carnívoro o que o teu me oferece de bom.
Vejo que me negas, vejo que hoje morrerei faminto de ti, e não tens o direito de agora me negar o que só, então, agora voltei a sentir de perto.
Me trazes vida.
Tua boca fumante tem sido meu desejo perpétuo de toda segunda-feira.
Mas foi por causa desses negros olhos teus que tive o peito acelerado e cúmplice do desastre que estás para me ocorrer. Ainda espero que me digam boas notícias tuas que me nutram bons sonhos e péssimas noites de sonos.
Por essa razão, talvez, prometo em segredo não te amar tanto a ponto de sofrer por isso.


*De 21/09/2009

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Bagunça.

São objetos arremessados por uma janela aberta de uma casa de dois andares. Calças jeans, camisas de botão, sapatos e até uma bola de futebol que ainda quicava rumo à sargeta. Apenas um sujeito parado, olhando estático, sob a janela. Parece que é ele o alvo dessa revolta que resultou numa bagunça de pertences em plena via pública. Na janela, uma mulher prepara-se para atirar com toda a força as coletâneas de cd's dele. A face dela, abrindo e fechando a boca e contraindo seus músculos de forma que movimenta a sobrancelha, revelando rugas por todo o rosto. É uma mulher irada, nos seus trinta, ou trinta e quatro anos.
Os curiosos, em suas janelas de apartamentos num prédio do outro lado da rua, notam e comentam a calma daquele cara parado na beira da rua olhando com estranha indiferença a mulher, apesar de todos os gritos histéricos e bestiais que xingavam-no sem parar.
Agora já estão no asfalto os pedaços soltos das capas dos discos de jazz e alguns dos Beatles. Não se vê coisas assim todos os dias, em plena madrugada. Um sujeito barbudo e de cabelos desgrenhados que se confundem com a própria barba está chegando perto, usando de como manto uma coberta azul listrada em branco com manchas de sujeira marrons. Tinha se levantado de algum canto escuro que escolheu para então passar a noite, caso não houvesse acontecido todo esse vexame que atraía cada vez mais espectadores. É um sujeito de passos descontraídos, quase dançantes, graciosos. Os olhos negros, inspecionam os objetos do chão. Pegou um disco e chegou próximo do homem plantado sob a janela.
Abriu a boca e falou sem hesitar:
- Cara, tu estás ferrado. Não tem conserto pra isso - disse o mendigo, olhando a face arranhada do disco que juntou.
- Parece que não tem mesmo. Olha só ela, me odeia. O estranho é que não me importo, não me sinto nem bem nem mal.
- Não, não. Ah, sim. Ela não sabe o que faz, és um sujeito tão boa-pinta, não se estraga um relacionamento só por que se arranja uma outra - aponta com seu dedo indicador para a mulher - olha só pra ela, tá toda estragada, o braço treme todas as gorduras só de jogar essas coisinhas, fizestes o certo.
O homem que estava apático, fez uma cara de indignação e olhou para o mendigo. Movimentou os lábios sem sair algum som e então disse:
- O quê!? Quem te disse que eu arranjei outra?
- Minha incrível sensibilidade para esses assuntos, sou um expert - disse, observando mais alguns itens no chão.
- És um bêbado abusado, isso sim. E eu não arranjei outra mulher.
- Ora, ora, que injúria! Vou ficar com esta bermuda como uma forma de compensar sua afronta. E pra sua informação não estou bêbado, nunca mais tive tanto dinheiro para isso...
- Ok, cara, vai embora.
- Que ingratidão, tento te ajudar e sou tratado com essa estupidez. Ainda estou olhando umas coisas que podem ser úteis, aqui...
- Não é questão de certo ou errado. Essa mulher foi a pessoa em quem eu depositei mais confiança, agora ela está louca só por que fui honesto demais.
- Nossa cara, o que você disse de honesto para ela? - o mendigo fez um olhar de interesse - que você gostaria de transar com uma cabra?
- Nossa, você é doentil!
- Experimenta passar alguns anos na rua e não se espantará mais comigo.
- Como viver com a alguém que você não conhece? Você percebe que após dois anos vivendo com uma habitual desconhecida, aquilo que não tinha significado continuou assim, e as expectativa de que se torne algo, se perde, vira rotina, mecânico. Sim, disse isso para ela.
- E pelo visto ela discordava de você.
- Mas estou de consciência limpa.
- Ao menos isso. E o que vais fazer, agora?
- Não sei ainda. Acho que vou esperá-la terminar de esbravejar.
A mulher terminou sua performance de irritada batendo com força a janela por onde arremessou tudo que conseguiu identificar como do sujeito amigado do mendigo. Passado algum tempo, o homem continuou sua conversa com o pedinte peludo, mas agora estavam rumando em sentidos contrários, todos procurando fazer aquilo que lhes dão equilíbrio.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Nudez.

As tetas sob minhas mãos nuas
esconderijo inviolável, paixão,
de necessidade e carícias.

Me chamar de indecente
é usar de palavras que não quer,
para poder vestir-se com as máscaras e fantasias
criadas por velhos religiosos que não têm fé.

A mentira é como um acessório para aparência e personalidade.
Esqueça as maquiagens e dogmas, respectivamente.
Apenas mostra a mentira que todos conhecem, enquanto
debaixo disso, és tão animal quanto qualquer outro,
sem roupas e preconceitos, linda.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Dia primeiro.

Mais um dia que passa.
Recebo como um presente
o ar, que respiro e que flui
entre os dedos da mão que acena.
É de nada para lugar nenhum.
Ainda é possível acreditar que
essa é a data de algo, e não
consigo lembrar.

É mais um cigarro sobre o cinzeiro
queimando o ar, para continuar vivo.
Ele ou eu, competindo,
obscenos.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Sobre o clima.

Listras verticais e cinzas caem do céu. À distância, os prédios parecem com desenhos fracos, translúcidos sobre uma tela branca. De perto, em movimento, as gotas de chuva parecem ser de prata, mas observando com maior atenção, o pingo, disforme sobre a palma da mão aberta, é apenas água suja de fuligem e sabe-se lá o que mais.
Clarão. Um raio cheio de ramificações, como as veias sobressaltadas na pele de quem sente raiva, surge. Ameaçador. É luminoso e hipnótico. O horizonte é de novo cinza e as coisas transparentes, quase esquecidas. Queria ter fé em deus, porém a única crença que existe é a de que mais cedo ou mais tarde o trovão virá. É tão fácil acreditar na ciência, é o simples entendimento da ação e reação. É óbvio que quando ocorre uma explosão decorrente de uma gigante descarga elétrica, é agitado o ar, que gera ondas acústicas que percorrem quilômetros até chegar aos ouvidos, como acaba de ocorrer. Mas bom mesmo seria acreditar que esse estrondo é um berro divino incompreensível aos homens, anunciando o apocalipse que exterminará os indivíduos de comportamentos moralmente inaceitos. Certamente o mundo seria melhor se os injustos fossem punidos. Eles não o são. E a cidade está aí. Nenhum demônio devorará alguma alma, nem deus abençoará, ou vice versa. Continua aí, desaparecendo debaixo do temporal, cinza, sujo de tanta humanidade. Ninguém me punirá, ou perdoará, verdadeiramente além de eu mesmo.
E quando o clima age violentamente, não é deus quem nos castiga, é só o resultado, a reação, da ação do homem sobre ele mesmo. Não é tão estranha a sensação de que somos todos idiotas que batem com as suas cabeça repetidamente numa parede esperando que alguém tenha dó. Mas essa, também, não é a única sensação. Os sentimentos são como estações que substituem-se. Numa hora somos onipotentes, noutra, os cordeiros esperando o abate.