segunda-feira, 17 de maio de 2010

Sobre o clima.

Listras verticais e cinzas caem do céu. À distância, os prédios parecem com desenhos fracos, translúcidos sobre uma tela branca. De perto, em movimento, as gotas de chuva parecem ser de prata, mas observando com maior atenção, o pingo, disforme sobre a palma da mão aberta, é apenas água suja de fuligem e sabe-se lá o que mais.
Clarão. Um raio cheio de ramificações, como as veias sobressaltadas na pele de quem sente raiva, surge. Ameaçador. É luminoso e hipnótico. O horizonte é de novo cinza e as coisas transparentes, quase esquecidas. Queria ter fé em deus, porém a única crença que existe é a de que mais cedo ou mais tarde o trovão virá. É tão fácil acreditar na ciência, é o simples entendimento da ação e reação. É óbvio que quando ocorre uma explosão decorrente de uma gigante descarga elétrica, é agitado o ar, que gera ondas acústicas que percorrem quilômetros até chegar aos ouvidos, como acaba de ocorrer. Mas bom mesmo seria acreditar que esse estrondo é um berro divino incompreensível aos homens, anunciando o apocalipse que exterminará os indivíduos de comportamentos moralmente inaceitos. Certamente o mundo seria melhor se os injustos fossem punidos. Eles não o são. E a cidade está aí. Nenhum demônio devorará alguma alma, nem deus abençoará, ou vice versa. Continua aí, desaparecendo debaixo do temporal, cinza, sujo de tanta humanidade. Ninguém me punirá, ou perdoará, verdadeiramente além de eu mesmo.
E quando o clima age violentamente, não é deus quem nos castiga, é só o resultado, a reação, da ação do homem sobre ele mesmo. Não é tão estranha a sensação de que somos todos idiotas que batem com as suas cabeça repetidamente numa parede esperando que alguém tenha dó. Mas essa, também, não é a única sensação. Os sentimentos são como estações que substituem-se. Numa hora somos onipotentes, noutra, os cordeiros esperando o abate.

2 comentários:

  1. Belo texto, você escreve bem. Infelizmente eu estou sem tempo para ler os outros textos, mas depois eu vou ler.
    Também infelizmente você não conheceu o maravilhoso Deus que eu conheço, pelo menos ainda não. Mas quem sabe.
    Abraço.

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  2. É interessante saber que toda essa tempestade que acontece na natureza acontece dentro de nós. Somos natureza plena.

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